sábado, 30 de novembro de 2013

Ação Administrativa especial de condenação à prática de ato devido


Este trabalho tem como tema a ação administrativa especial de condenação à prática do ato devido, regulado nos artigos 66º a 71º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ( doravante CPTA). Com este propósito, cabe-nos fazer uma breve referência a temas como a origem desta ação especial, os seus pressupostos de aplicação e a legitimidade ativa e passiva para intentar a ação. O prazo e o conteúdo da sentença também serão abordados. Dada a abrangência do tema, faremos uma análise concisa dos aspetos mais relevantes supra referidos.

1. Origem da ação de condenação

A origem da ação administrativa especial de condenação à pratica de ato devido, advém da revisão constitucional de 1997. O Contencioso Administrativo ditou uma estrita separação entre administrar e julgar, proveniente do princípio da separação de poderes. Assim, o juiz não podia dar ordens à Administração, uma vez que tal facto era entendido como uma usurpação de poderes pelos Tribunais. Ora, tal dificultava a tarefa do julgador, uma vez que, segundo PROSPER WEIL uma ordem proveniente de um juiz “não teria mais eficácia do que a da anulação pura e simples” do ato praticado pela Administração.

Como afirma VASCO PEREIRA DA SILVA, este limite derivava dos “traumas de infância do Contencioso Administrativo”, uma vez que se confunde a matéria sobre a qual se pode julgar e os casos em que apenas a Administração poderá praticar o ato, e por isso não poderá existir substituição. O Autor diferencia a condenação da Administração à pratica de atos administrativos devidos, fundados em poderes legais vinculativos, nos quais o juiz pode condenar a Administração dos casos em que a condenação à prática de dado ato substancia uma intromissão na discricionariedade administrativa e logo, um desvio ao princípio da separação de poderes. Do exposto resulta que, a sentença de condenação da Administração à prática de atos devidos tem por base os atos vinculados da administração e não os discricionários, ou melhor, os aspetos vinculados do poder discricionário, dado que não existem atos puramente discricionários, uma vez que a discricionariedade não constitui uma exceção ao princípio da legalidade.

Tradicionalmente, seguindo a inspiração francesa a condenação da Administração só era admitida quando existisse uma ação. Esta última poderia materializar-se num ato prévio emitido pela Administração ou numa ficção legal de “ato tácito de indeferimento”. Esta solução legislativa justificava-se pelo facto de a Administração ser agressiva dos direitos e interesses de particulares, pelo que a tutela dos seus direitos se bastava com a anulação do ato lesivo.

Com o Estado Social, a Administração passou a assumir diferentes funções que a transformaram numa Administração prestadora e infraestrutural. Assim, surgiram conceitos como o ato favorável ou desfavorável que careciam de resolução. As próprias omissões da Administração eram agora relevantes juridicamente. Neste contexto, a tutela dos direitos e interesses dos particulares teria de sofrer alterações de modo a abranger todas as situações provenientes da alteração da Administração, pois o recurso de mera anulação já não era um meio de tutela eficaz dos direitos dos particulares.

Com esse intuito surge a reforma constitucional de 1997. O artigo 268º/4 da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), referente à tutela jurisdicional efetiva dos direitos dos particulares, passa a prever expressamente a possibilidade do particular ver o seu direito, ou interesse legítimo, tutelado através da “determinação da prática de atos legalmente devidos”. Com esta redação, o legislador introduz preceitos que vão originar uma mudança de paradigma no ato de condenação da administração. A doutrina diverge quanto ao entendimento da alteração formulada pelo legislador. Dado que a tutela jurisdicional efetiva dos direitos dos particulares constitui natureza de direito fundamental, o artigo 268º/4 da CRP era de aplicação imediata, pelo que parte da doutrina, na qual se inclui SÉRVULO CORREIA, advogam que o legislador constituinte criou um novo meio processual de natureza condenatória. Em sentido contrário, VASCO PEREIRA DA SILVA, defendia que, o legislador tinha consagrado o direito à tutela dos direitos provenientes da prática de atos legalmente devidos, mas que tal não significava a criação direta de um novo meio processual. Este era, no seu entender, necessário, mas com intervenção do legislador ordinário, promovendo uma reforma do Contencioso Administrativo. A referida reforma foi realizada e  introduziu no CPTA os artigos  relativos à ação de condenação à prática do ato devido. Como afirma VIEIRA DE ANDRADE, a construção da ação de condenação foi uma opção legislativa, dado que a tutela jurisdicional poderia ser alcançada através de outros meios, como a pronúncia judicial declarativa ou a sentença substitutiva.

A introdução desta nova ação administrativa especial conduziu a importantes alterações, nomeadamente a nível de direito substantivo, com a extinção da figura do indeferimento tácito. Esta figura torna-se desnecessária, pois o particular consegue tutelar o seu direito sem recorrer a uma figura ficcionada por lei, mas tendo por base a omissão pura e simples da Administração. Tal facto, faz com que esteja revogada a parte final do  artigo 109º/1 do Código de Processo Administrativo, quando estatui “a faculdade de presumir indeferida a pretensão, para poder exercer o respetivo meio legal de impugnação”.

2. Objeto

O pedido destina-se a obter a “condenação da entidade competente à prática, dentro de determinado prazo, de um ato administrativo que tenha sido ilegalmente omitido ou recusado”, como expresso no artigo 66º/1 do CPTA. Assim, VIEIRA DE ANDRADE considera que o ato devido abrange todo o ato administrativo que deveria ter sido omitido e não foi, independentemente de existir uma omissão pura ou uma recusa pela Administração, e também o ato que não satisfaça as pretensões do particular. Uma questão que se coloca é saber se a legalidade referida  “ato ilegalmente omitido ou recusado” deve ser entendida em sentido amplo ou restrito. Para o Autor supra referido, a ação em causa pode ser utilizada quando está em causa a obtenção do cumprimento de um ato devido por força de um contrato, sentença, além dos casos em que a lei e/ou regulamento impõem à Administração a prática de um determinado ato. Também ESTEVES DE OLIVEIRA segue este entendimento amplo de ato administrativo devido, quando refere que este abrange “ qualquer antecedente jurídico que disponha vinculadamente sobre um acto administrativo a praticar pela Administração, não dando , nessa medida, margem para avaliações próprias”.

De referir, mais uma vez, que o fato de o ato a praticar corresponder a uma vinculação legal da administração, não exclui os atos discricionários, pois estes podem ser apreciados nos seus aspetos vinculados, como é o caso da competência, do seu fim e do respeito pelos princípios administrativos como o da proporcionalidade, igualdade, boa-fé e imparcialidade.

 Ora, o CPTA consagra de forma expressa que a ação de condenação à pratica do ato devido tem por objeto a pretensão do interessado, no seu artigo 66º/2. Por conseguinte,  nas palavras de ESTEVES DE OLIVEIRA, o processo “respeita diretamente à relação material controvertida, onde o que importa é averiguar do mérito ou do bem fundado da pretensão do autor”. Este facto, como advoga VASCO PEREIRA DA SILVA torna irrelevante a existência ou não de ato administrativo prévio, e quando exista, não é autónomo do processo. Assim sendo, o foco é o direito do particular a uma determinada conduta da Administração, pelo que a condenação à pratica do ato devido acarreta a eliminação do ato prévio contrário ao direito subjetivo do lesado.

Sendo o objeto, o direito do particular decorrente do direito substantivo do particular resultante da sua relação com a Administração, o ato administrativo praticado pela Administração não cristaliza no tempo, como defende MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, do ponto de vista processual. Refira-se, ainda, que o objeto da ação denota a natureza deste meio processual como subjetivista. Resta apenas acrescentar que a causa de pedir da ação intentada é a lesão que o particular sofreu pela atuação ou omissão da conduta por parte da Administração. 

3. Pressupostos da ação de condenação

O CPTA consagra no artigo 67º/1 pressupostos para que a ação de condenação à pratica de ato devido possa ser intentada, no entanto estes, não são suficientes. Além deles é necessário que o particular dirija um requerimento ao órgão competente para decidir. É este, portanto, um pressuposto inominado. Nos casos legalmente previsto é ainda obrigatória uma prévia impugnação administrativa.

São assim pressupostos de aplicação: o requerimento à administração para praticar o ato devido e a omissão de decisão ao requerimento, a recusa da prática do ato devido ou a recusa de apreciação do requerimento.

Assim, não sendo respeitado o direito subjetivo do particular, cabe-lhe deduzir um pedido à prática do ato administrativo devido. Este é um pressuposto geral de acesso ao processo de condenação à prática do ato devido. Só depois da recusa do requerimento ou do silêncio da Administração, é que o particular pode intentar uma ação de condenação à pratica do ato devido. Para MÁRIO AROSO DE ALMEIDA tal deve valer para todas as situações, independentemente de o dever de praticar o ato resulte de lei, regulamento ou de vínculo contratual. Defende a sua tese, argumentando que, a apresentação de regulamento é requisito de que depende a configuração da situação como necessitada de tutela judicial, e logo de interesse em agir. Pelo que na ausência de requerimento faltará interesse processual em agir. Esta posição é também sufragada por VIEIRA DE ANDRADE.

ESTEVES DE OLIVEIRA advoga que, tendo o ato devido origem legal e esta não preveja requerimento que a coloque “em mora”, o particular pode demandar a Administração imediatamente em juízo, como é o caso dos atos administrativos de iniciativa contenciosa e de interesse particular, que não sejam discricionários quanto à sua oportunidade e ao seu momento.

Para que estejam preenchidos os requisitos de aplicação da alínea a) do artigo 67º/1 é necessário que: tenha sido apresentada à autoridade administrativa competente e com o dever legal de decidir, um requerimento; que não haja resposta da Administração ao requerimento e por último, que o silêncio da Administração não possua qualquer valor legal (configurando uma situação de deferimento tácito segundo o artigo 108º CPA). Estas situações constituem comportamentos de pura inércia da Administração.

As alíneas b) e c) do mesmo artigo são decisões de conteúdo negativo, pelo que VASCO PEREIRA DA SILVA afirma que se devem reconduzir à mesma situação. Segundo a alínea b), o particular pode intentar a ação quando, depois de dirigido à Administração o requerimento, esta recusa a prática do ato devido. O indeferimento pode ser puro e simples como no caso da Administração recusar expressamente o pedido ou resultar de forma implícita ou tácita, por exemplo, praticar um ato contrário ao pedido requerido pelo particular.

Questão suscitada é a de saber qual a ação que deve ser intentada quando a Administração profere uma decisão que só em parte é desfavorável ao particular. Para MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, este ato pode ser tido como indeferimento, mas apenas relativamente  à parte que tem conteúdo desfavorável. Assim, se o particular intentar uma ação de condenação à pratica de ato devido, a sentença poderá substituir o que foi praticado, não tendo o particular de impugnar o ato, pedindo a anulação do mesmo. O mesmo Autor, defende que o particular deve intentar uma ação de condenação à pratica do ato devido em certos casos de aplicação do artigo 47º/2) do CPTA. Deve fazê-lo quando o ato administrativo seja simultaneamente de conteúdo positivo e negativo em relação à pretensão do interessado e o particular não pretenda apenas a anulação mas a substituição do ato por outro.

Cabe referir que, no caso da alínea c), a Administração profere uma decisão, mas não se pronuncia sobre o mérito da pretensão. O objetivo do legislador, na separação das alíneas b) e c) consistiu na autonomia do requerimento que pode ser apreciado independentemente da análise  de mérito que é formulada. Assim, a recusa nos termos da alínea c) pode ser justificada por inexistência dos motivos de ordem formal ou com base na falta de fundamento normativo que permita a sua invocação.   

Por último, existe um requisito que é apenas aplicado para as situações em que a lei expressamente o estatui: a necessidade de impugnação administrativa. As impugnações administrativas estão reguladas nos artigos 158º e ss do CPA. Quando a lei prevê a prévia utilização da impugnação administrativa necessária, quer seja por forma de reclamação, recurso hierárquico ou tutelar, o particular deve esgotar a via administrativa antes de recorrer à via contenciosa, constitui, assim, um ónus. 

4. Legitimidade

Quanto à legitimidade cabe tratar da legitimidade ativa e passiva, reguladas nos artigos 68º/1 e 68º/2 do CPTA respetivamente. O legislador consagrou uma norma especial relativamente à legitimidade ativa, que se justifica pela natureza do pedido.

Assim, afigura-se no artigo 68º do CPTA o elenco de sujeitos processuais com legitimidade ativa: os indivíduos que aleguem a titularidade de um direito suscetível de ser satisfeito  com a emissão de um ato administrativo, quer o sujeito privado em causa seja singular [ alínea a)] ou plural [ alínea b)], tem, no entanto, que mostrar um interesse direto e pessoal na prática do ato. Têm também legitimidade ativa as pessoas coletivas pela alínea b) e os órgãos administrativos, segundo o entendimento de  VASCO PEREIRA DA SILVA. Afirma o autor que, o preceito não justifica que se faça uma distinção entre relações externas e internas à Administração, pelo que, se aplicam nas relações entre órgãos administrativos, além disso argumenta que os verdadeiros sujeitos processuais são os órgãos e não as pessoas coletivas.

É também dada legitimidade ativa ao Ministério Público, na alínea c) do preceito, no entanto, existem condicionalismos ao seu exercício. Assim, o Ministério Público apenas tem legitimidade ativa quando estejam em causa ofensas a: direitos fundamentais, interesses públicos especialmente relevantes e bens e valores referidos no artigo 9º/2 do CPTA. De notar que, apesar da limitação, a introdução do Ministério Público como parte processual ativa confere alguma objetividade a este meio processual de cariz subjetivista. No entanto, a legitimidade do Ministério Público apresenta-se controvertida relativamente às ações de condenação da prática de ato devido. VASCO PEREIRA DA SILVA advoga que só é admitida legitimidade ativa ao Ministério Público ( ou do ator popular) quando esteja em causa um ato emitido de conteúdo negativo, já não para a omissão administrativa. Em sentido contrário, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E VIEIRA DE ANDRADE, defendem que o Ministério Público possui legitimidade em ambos os casos.

Por último, o artigo confere legitimidade ativa ao ator popular na alínea d) do seu número 1, para intentar uma ação de condenação à pratica do ato devido quando, tendo apresentado um requerimento à Administração, quando o ato ilegalmente omitido ou recusado respeitar a bens e valores constitucionalmente protegidos como os constantes do artigo 9º/2 do CPTA.

Relativamente à legitimidade passiva, o artigo 68º/2 dispõe que são demandados a entidade responsável pela situação de omissão legal e os contrainteressados a quem a prática do ato omitido possa prejudicar ou que tenha interesse legítimo em que o ato não seja praticado. Quanto aos primeiros, cabe referir que estes são determinados de acordo com a regra geral do artigo 10º/2 do CPTA. Assim, a parte demandada é a pessoa coletiva ou o ministério a que pertence o órgão a quem o requerimento foi dirigido, o que implica que seja demandada uma pessoa que pode não ter sido responsável pela omissão. Tal fato justifica-se pela tutela do particular. No caso de se tratar de uma relação interorgânica, são demandados os próprios órgãos que omitiram ou recusaram a prática do ato requerido.

No que respeita aos contrainteressados, estes devem integrar o processo formando com a pessoa coletiva demandada um litisconsórcio necessário, nos termos do artigo 68º/2 do CPTA.

5. Prazos

Os prazos para intentar a ação de condenação dependem da resposta da Administração ao requerimento efetuado pelo particular. Como consta do artigo 69º do CPTA,

No caso de inércia por parte da Administração, a ação deve ser proposta no prazo de um ano a contar do fim do prazo legal dentro do qual a Administração deveria ter dado resposta ao requerimento do particular. Não existindo norma especial aplica-se o artigo 58º/1 do CPA conferindo à Administração 90 dias para a sua pronúncia. Decorrido um ano sobre essa data o prazo do direito de ação caduca. É este o regime do artigo 69º/1 do CPTA. Caso o prazo cesse o particular pode intentar nova ação contenciosa, mas não antes de dirigir um novo requerimento à Administração ainda que com o mesmo pedido e conteúdo do primeiro. Existe no entanto uma exceção. Quando a parte ativa é o Ministério Público, dado que este não tem que apresentar requerimento, o prazo de um ano é contado desde a constituição legal do dever de pronúncia do órgão competente.

Quando a Administração indefere o requerimento, ou se recusa a apreciá-lo, aplica-se o disposto no artigo 69º/2 e 3 do CPTA. Assim, o prazo é de três meses desde a notificação do ato remetendo para o regime dos artigos 59º e 60º do CPTA. Questão que se coloca é a de saber se se devem distinguir os atos nulos dos anuláveis. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA baseia-se na analogia existente entre os artigos 68º/2 e 58º/2 b), para justificar a aplicação distinta dos prazos consoante esteja em causa um ato nulo ou anulável. Por conseguinte, estando perante um ato anulável aplicar-se-ia o disposto no artigo 68º/2 do CPTA, o prazo de três meses. Estando em causa um ato nulo, justificar-se-ia a aplicação analógica do artigo 58º/1 do CPTA, pelo que a ação de condenação à prática do ato devido em situações de ato negativo nulo, não se aplicaria qualquer prazo. No entanto, a jurisprudência e a maioria da doutrina não encontra razão para se fazer esta distinção quando o próprio legislador processual não diferenciou.

6. Conteúdo das sentenças

O particular pode utilizar este meio processual para obter um ato da administração a cuja emissão a Administração estava vinculada. No entanto, o conteúdo das sentenças das ações de condenação à prática de ato devido são muito divergentes, uma vez que têm em conta o ato concreto a praticar pela Administração.

Relativamente a este tema, releva mais uma vez a vinculação ou a discricionariedade da Administração na emissão do ato. De acordo com esta diferença, as sentenças podem ser de vários tipos. Para VASCO PEREIRA DA SILVA as sentenças podem ser de dois tipos: condenação da Administração à prática de um ato administrativo cujo conteúdo está definido na sentença, uma vez que é relativo a um ato vinculado ou condenação da Administração à prática de um ato administrativo cujo conteúdo é relativamente indeterminado, na qual, por estarem em causa escolhas da responsabilidade da Administração, o juiz se limita a indicar a forma adequada de exercício do poder discricionário, no caso concreto, estabelecendo critérios que devem ser atendidos pela Administração na emissão do ato devido.

No entendimento de MÁRIO AROSO DE ALMEIDA existem três tipos de sentença, uma vez que desdobra a condenação da Administração à prática de um ato administrativo cujo conteúdo está definido na sentença. Portanto, as sentenças podem conferir ao autor um direito com dado conteúdo, constituindo a Administração no dever de praticar o ato com o conteúdo determinado; podem ainda ser casos em que, existindo discricionariedade da Administração para tais situações, no caso concreto, a discricionariedade encontra-se reduzida a zero, pelo que, a Administração terá de praticar o ato com o conteúdo emanado da sentença, e por fim, as sentenças podem corresponder a situações de atos discricionários estando a Administração vinculada à sua prática mas não ao conteúdo do mesmo.

Ambas as teses se conciliam com o artigo 71º do CPTA.  No seu número um, ao referir que o tribunal se pronuncia “sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do ato devido”, o CPTA admite que o tribunal condene a Administração à prática de um ato com o conteúdo por si determinado. Já o número dois do mesmo preceito, deverá aplicar-se quando estão em causa poderes discricionários da Administração, mas o tribunal, não podendo determinar o conteúdo da sentença, deve definir o modo de exercício deste poder, tendo por base o caso concreto. Ora esta posição é também defendida pelos autores referidos.

Pelo exposto, as sentenças poderão ter um conteúdo misto, uma vez que se assemelham a sentenças de condenação quando referentes à prática de atos vinculados, mas quando estão em causa atos discricionários, acentua-se a vertente declarativa da sentença proferida.

Decorre do supra mencionado que a condenação à prática de ato devido é um meio processual relativamente recente no nosso ordenamento jurídico e que tem por fim colmatar uma tutela originada na função prestadora da Administração, e que foi consagrada constitucionalmente no artigo 268º/4 da CRP. O particular  intenta esta ação cujo objeto se centra no seu direito a uma dada conduta por parte da Administração. Para o efeito, terá que dirigir previamente um requerimento à Administração e, só perante a não pronúncia em tempo legal, o indeferimento do ato a praticar ou o indeferimento liminar do requerimento o particular ou os demais sujeitos processuais ativos (excetuando o Ministério Público e o ator popular) podem lançar mão à via contenciosa. Torna-se desde logo necessário o respeito pelos prazos de um ano ou três meses conforme o fundamento da ação intentada. Por fim, o conteúdo da sentença irá atender ao caso em questão e será distinto conforme o ato a praticar pela Administração se trate de um ato vinculado ou discricionário.

Bibliografia:

Andrade, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa: Lições, Almedina, Coimbra, 2009

Almeida, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, Almedina, Coimbra, 2013

- O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, Coimbra,  2007

Oliveira, Mário Esteves de, Código de Processo nos Tribunais Administrativos: estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais: anotados, Coimbra, Almedina, 2006

Silva, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as acções no novo processo administrativo, Almedina, Coimbra, 2009

Trabalho realizado por: Ana Simões Esteves      Nº 20780            

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