quinta-feira, 28 de novembro de 2013




O contencioso eleitoral

O Código dos Tribunais Administrativos e Fiscais, prevê no seu Título IV quatro tipos de situações em que se entende existir a necessidade de obter com urgência uma decisão de mérito da causa. Devido a essa urgência, são instituídos processos especiais que se caracterizam por uma tramitação célere em contraste com a tramitação normal dos demais processos. Assim, como podemos verificar, o CPTA dá o nome de “processos urgentes” a estas formas de processo no seu Título IV, que seguem o regime dos artigos 36º/ 1 e 2 e 147º.

Observa-se uma subdivisão destes processos urgentes:
- Impugnações urgentes
- Intimações

Dentro das impugnações urgentes temos o contencioso eleitoral, de que vou tratar, e que se encontra regulado nos artigos 97º a 99º e o contencioso pré-contratual que é regulado nos artigos 100 a 103º. Por sua vez, dentro das intimações temos a intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões estabelecida nos artigos 104º a 108º e a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias nos artigos 109º a 111º, todos do CPTA.


O professor Vieira de Andrade pronuncia-se acerca da designação de impugnações: “A designação legal de impugnações aponta para processos em que estará em causa, em primeira linha, a verificação da legalidade de pronúncias da Administração, mas tal não significa necessariamente que as correspondentes sentenças se refiram apenas à invalidade dos actos impugnados, isto é, que sejam, por definição, declarativas ou constitutivas, pois que, seguramente no caso dos processos eleitorais, mas também nos processos pré-contratuais, pode pedir-se e obter-se a condenação directa da Administração.”.


É de salientar, que apesar se serem reguladas só quatro formas de processo urgentes no CPTA, temos processos declarativos urgentes regulados em legislação especial como é o caso da lei 27/96 de 1 de Agosto (que regula a acção para declaração de perda de mandato), do Decreto-lei n.º 555/99 de 16 de Dezembro (que regula o processo de intimação para a pratica de acto legalmente devido) e a lei 27/2008 de 30 de Junho (que regula os processos de concessão ou perda de asilo e de expulsão).
Feito este enquadramento geral, cabe proceder à análise concreta do contencioso eleitoral que é o cerne deste post, começando por uma breve distrinça em relação ao contencioso eleitoral político. 


Alguns autores distinguem o contencioso eleitoral político do contencioso eleitoral no âmbito administrativo em razão da qualidade do eleitor. Assim, ficariam inseridos no primeiro os litígios em que o principal eleitor seria o cidadão, enquanto que no segundo a capacidade eleitoral radicava num certo status, isto é, a pertença a uma dada categoria profissional ou corporacional. No entanto, segundo o professor Jorge Miranda, este critério é demasiado formal parecendo subalternizar os sujeitos das candidaturas. Mais adequado parece falar-se em "actos materialmente juridico-constitucionais, ou em considerar o contencioso eleitoral politico como instrumental em face da formação da vontade politica do povo a todos os níveis. Essa formação seria traduzida no sufrágio directo e universal (...) O contencioso eleitoral politico é um contencioso constitucional."


Mais especificamente, o contencioso eleitoral, previsto no artigo 97º do CPTA, é uma espécie de acção administrativa especial urgente como nos diz o professor Mário Aroso de Almeida. Tem de ter como objecto a impugnação de actos administrativos na medida em que o tribunal tem poderes de plena jurisdição (artigo 97º/2).~
 Nesta forma de impugnação urgente, estão em causa litígios relativos aos processos eleitorais que legislação especial não submeta ao Tribunal Constitucional ou aos tribunais judiciais (artigo 4º/1 alínea m) do ETAF). Assim estão incluídos no âmbito deste processo os litígios relacionados com a eleição dos titulares de órgãos que se realizam no seio de entidades administrativas como as instituições públicas de ensino superior, hospitais etc. Por excluídas temos todas as eleições em Portugal por sufrágio directo e universal dos cidadãos eleitores para os órgãos de soberania e autarquias locais. Como nos diz o professor Jorge Miranda no Contencioso eleitoral português, “o contencioso eleitoral administrativo, terá que ver com os actos de segundo grau em face dos actos eleitorais políticos, ocupando-se de órgãos electivos da administração, designadamente da autónoma”.                    

Quanto aos pressupostos que aferem a legitimidade e o prazo, encontram-se previstos no artigos 98º, nº1 e nº2, do CPTA, ou seja, podem ser intentados por quem, na eleição em causa, seja eleitor ou elegível ou, quanto à omissão nos cadernos ou listas eleitorais, também pelas pessoas cuja inscrição haja sido omitida e quanto ao prazo de propositura de acção, na falta de disposição especial, é de sete dias a contar da data em que seja possível o conhecimento do ato ou da omissão. Quanto ao artigo 98º/3 é possível verificar que o CPTA abandonou o requisito da horizontalidade do acto. Na sequência, uma possível interpretação para este artigo 98.3 CPTA é a de entender que se no procedimento anterior ao acto eleitoral propriamente dito existir um acto que lese direitos protegidos e que tenha eficácia externa tal acto será susceptível de impugnação autónoma.

Se não existisse o contencioso eleitoral para estas situações, estes litígios seriam submetidos à acção administrativa especial uma vez que neles se pretende o mesmo tipo de pretensões. Existindo, o artigo 97º do CPTA, o modelo de tramitação a seguir por este processo urgente é o da acção administrativa especial e portanto aplicam-se os artigos 78º e seguintes do CPTA, embora com as particularidades do artigo 99º.


Em jeito de conclusão, importa referir que o contencioso eleitoral não se aplica a todas as situações em que estejam em causa eleições. É necessário ter em conta este aspecto, uma vez que o processo urgente do contencioso eleitoral é circunscrito às entidades administrativas e/ou pessoas colectivas. Deste modo, não se aplica às eleições por sufrágio directo e universal por exemplo dos órgãos de soberania e das autarquias locais como já foi referido. 

Em sede deste tema é relevante o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte com o processo 00784/11.0BECBR de 25 de Maio de 2012.



Bibliografia
Andrade, Vieira de. A Justiça Administrativa (Lições). 10ª ed. Coimbra: Almedina, 2009.
Almeida, Mário Aroso de. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos. 4ª ed.                     
Coimbra: Almedina, 2005.



                                                                                                            Madalena Cesteiro 

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