sexta-feira, 29 de novembro de 2013

O papel do Ministério Público no Contencioso Administrativo



No seguimento da simulação realizada por nós, alunos, e pela parte que me competiu encarnar, achei interessante perceber melhor como o Ministério Público intervém nas acções e em que medida a sua intervenção é relevante.


Antes de mais necessitamos de questionar: quem é o Ministério Público?
O Ministério Público (adiante MP) é um “órgão constitucional da administração da justiça”, retirando a expressão do professor Vieira de Andrade, e diz-nos o artigo 219º, nº4 da CRP que é composto por um conjunto de magistrados subordinados (à parte principal), com autonomia. Tem um estatuto próprio e poderá, num processo, ser parte principal (autor público ou popular) ou acessória (com poderes mais limitados). Tem como funções, entre outras, defender a legalidade fiscalizando a constitucionalidade dos actos normativos (função objectivista, como denomina a professora Alexandra Leitão), representar o Estado (função subjectivista) e defender o interesse público. Segundo o professor Sérvulo Correia, o MP caracteriza-se pela unidade orgânica, variadíssimas funções e pela prossecução dos interesses públicos.


O MP é autor nos casos em que defende os interesses constitucionalmente protegidos, no âmbito da propositura de acções públicas (artigo 9, nº2 do CPTA). No entanto, tratar-se-á de representante do Estado quando acções sejam propostas contra este (artigo 11º, nº2), acções comuns em matéria de responsabilidade civil ou que digam respeito a contratos, ou seja, poderá colocar-se também na posição réu. Isto porque em acções intentadas contra entidades públicas, tem legitimidade passiva a pessoa colectiva e não um órgão dela pertencente. 
E no caso de se ter de colocar nas duas posições, ou seja, propor uma acção pública e representar o Estado? O artigo 69º do Estatuto do Ministério Público esclarece que prevalecerá a acção pública devido ao interesse subjacente (defesa da legalidade). No entanto a professora Alexandra Leitão considera que este artigo não resolve o problema. E por isso defende que o melhor seria o MP não representar o Estado e ser nomeado um advogado pela Ordem dos Advogados ou constituindo mandatário judicial acabaria com o problema, sem existirem contradições. E aqui concordo com a professora, o facto de ser constituído mandatário judicial afastaria a aplicação do artigo 69º e solucionava a questão.


Quanto a acções administrativas especiais, o MP poderá sempre intervir quando estejam em causa direitos fundamentais dos cidadãos (artigo 85º do CPTA), mesmo não se tratando de uma das partes. Tem assim como finalidade a defesa do interesse público. O Professor Aroso de Almeida diz tratar-se de um requerimento ou parecer sobre o mérito da causa pelo facto de se pronunciar sobre a decisão que deve ser tomada pelo tribunal.


Quando tal aconteça, o MP faz uma análise do processo e vê se fará sentido a sua intervenção de acordo com, os já pronunciados, direitos constitucionalmente protegidos. Direitos como saúde pública, o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território, a qualidade de vida, o património cultural ou os bens do Estado fazem com que o MP pondere na sua intervenção em defesa dos cidadãos. Em caso de impugnação, pode ainda invocar a invalidade do acto impugnado (artigo 85º, nº3 e 4 do CPTA) mas nunca sobre aspectos processuais.


Terá o prazo de 10 dias para intervir depois da citação do réu e dos contra-interessados (artigo 85º, nº5 do CPTA) e terá de preencher os pressupostos do nº2 do artigo 85, nº2 para se pronunciar sobre o mérito da causa.


O MP, em caso de desistência do autor, pode requerer o prosseguimento de acções de impugnação de actos administrativos no caso de ter relevância na prossecução do interesse público. Como nos diz o professor Aroso de Almeida “(…) o Ministério Público deve, portanto, dar seguimento às acções que, na ausência de iniciativa particular, ele próprio teria proposto, no exercício da acção pública.” Pode assim, requerer providências cautelares nos termos do artigo 114, nº1, alínea c) e ainda o prosseguimento do processo cautelar pendente intentado pelo autor desistente, de acordo com o artigo 112º, nº1; 124º, nº1 e 130º.


No fundo poderá impugnar actos administrativos (artigo 55º, nº1, alínea b) do CPTA), pedir a condenação à prática de actos devidos (artigo 68º, nº1, alínea c)), a declaração de ilegalidade por omissão de normas (artigo 77º) e ainda a execução de sentenças enquanto defensor dos interesses da comunidade.


Dadas estas funções atribuídas ao MP, serão elas excessivas? Não considero que sejam, uma vez que tem na base, como sabemos, a defesa do interesse público e, portanto, representa os cidadãos, como defensor dos seus direitos e interesses. É algo que julgo de importância extrema.





Bibliografia:


SILVA, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2ª Edição, Almedina;


ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, Almedina, Coimbra, 2013;


ANDRADE, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa (lições), 12ª Edição, Almedina, Coimbra, Outubro de 2012;


CORREIA, Sérvulo, A reforma do contencioso administrativo e as funções do Ministério Público, in Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, 2001;


LEITÃO, Alexandra, A representação do Estado pelo Ministério Público In Revista Julgar, nº20, Maio/Agosto de 2013, Coimbra.



Joana Pinto

Nº21378

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