Análise ao
artigo 121º do CPTA
“
Decisão da causa principal “
1 - Quando a manifesta urgência na
resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade
dos interesses envolvidos, permita concluir que a situação não se compadece com
a adoção de uma simples providência cautelar e tenham sido trazidos ao processo
todos os elementos necessários para o efeito, o tribunal pode, ouvidas as
partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal.
2 -
A decisão de antecipar o juízo sobre a causa principal é passível de impugnação
nos termos gerais.
****
Este artigo foi inspirado no regime italiano, e
corresponde a uma das inovações trazidas pela última Reforma do Contencioso
Administrativo.
Com o incremento desta norma, passou a ser possível emitir um juízo sobre a
causa principal na pendência de um processo cautela (neste sentido, estarão em
causa providências cautelares dos artigos 112º, 130 nº 4 e 137º do CPTA)
A convolação do processo cautelar em processo principal
pode ser promovido por iniciativa
oficiosa do tribunal ou suscitado pelas partes .
A razão de ser
da norma prende-se com fatores de economia processual e garantia da tutela
jurisdicional efetiva.
Para que o instituto previsto no art.º
121ºdo CPTA possa operar, é necessária a verificação cumulativa de dois pressupostos, destacados pelo TCA Norte
26.07.2007 (Tribunal Central Administrativo) e pelo Professor AROSO DE
ALMEIDA :
1. “… a manifesta urgência na resolução definitiva do caso”
2. “… tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito”
Análise de cada requisito:
Quanto ao 1º :
“O juízo substantivo sobre a
manifesta urgência na resolução definitiva do caso, impõe interpretação e
aplicação exigentes, e impõe também, especial cuidado e grande prudência por
parte do julgador ”
Quanto aos critérios para se apurar a “urgência”, deve-se atender à natureza das questões e à gravidade dos interesses em causa.
O 2º requisito :
Tal obrigação remete para o facto
de o tribunal não dever antecipar a decisão sobre o mérito da causa , mas sim ,
optar pela providência cautelar se seguramente ainda for possível trazer ao
processo elementos que relevam para a decisão de fundo.
Quando falte a “segurança”, a melhor solução parece ser a defendida por AROSO DE ALMEIDA que afirma que o caminho será o de atribuir a providência sem mais indagações nos termos do art. 120º/1/a) CPTA.
“Ouvir as partes interessadas”
É uma manifestação
do principio do contraditório, já que o juiz ouve as eventuais objeções que as
partes formulem acerca da verificação dos requisitos supra referidos , uma vez que, a audição das partes
corresponde a um dever inerente ao juiz .
Aresto do TCA Norte de 26.07.2007, processo nº
3160/06.3BEPRT
Um aresto que
versa sobre o tema em causa, teve lugar após uma sentença do Tribunal Administrativo
e Fiscal do Porto de 23.02.2007, em que foi intentado um pedido de suspensão da
eficácia de um ato de punição disciplinar(dois anos de inatividade ) a um
bombeiro do Município do Porto, como preliminar de uma Ação Administrativa
Especial . O requerente invocou a ilegalidade da decisão , sugerindo ainda a convolação
da pretensão em anulação daquele despacho, pois no seu entender estariam preenchidos todos os
pressupostos do art.º 121º do CPTA. Após a oposição do Município do Porto, o
requerente veio ainda cumular uma providência de admissão provisória em
concurso aberto para curso de promoção para Bombeiros Sapador.
O TAF do Porto
veio considerar verificados os pressupostos do 121º do CPTA, tendo julgado
improcedente a pretensão de impugnação do ato e prejudicada as restantes questões.
Após tal situação
, o Bombeiro muito surpreendido, veio então, recorrer da decisão para o TCA Norte
, pois acreditava firmemente na violação do art. 121º do CPTA, uma vez que , a antecipação
da decisão de fundo e a convolação do processo cautelar e principal, só deveria
ser possível se o resultado fosse favorável ao recorrente.
Neste aresto , o
TCA do Norte explicita quais são os pressupostos de aplicabilidade do mecanismo
(supra citados) e enumera os riscos a
que ficam sujeito as partes ao recorrer ao art. 121º.
O TCA
considerou que os interesses relevantes envolvidos, para efeitos de aferição de
manifesta urgência ,não tem de ser relativos a direitos, liberdades e
garantias, já que para o efeito já estava
previsto o mecanismo do art º 109º do CPTA. Antes pelo contrário, a urgência pode
ser indiciada pelo facto de o litigio versar sobre outros direitos, como por
exemplo , alguns dos valores do artº.9nº2 do CPTA, não excluindo que outros
bens também relevantes, pudessem justificar a utilização de decisão urgente (como
seria o caso em questão).
O TCA Norte
portanto entendeu:
“As
ilegalidades imputadas à decisão administrativa
pelo requerente cautelar, a fim de justificar o fumus boni iuris necessário para
a concessão das providências pretendidas, seriam exatamente as mesmas que
serviam de causa de pedir na ação principal, sendo que não havia na verdade ,
um único facto de prova relevante para a decisão da causa que tivesse de ser sujeito ao fogo da
prova.”
Ainda sobre a questão
de ser necessário um juízo positivo da utilização
do art. 121º, o TCA Norte pronunciou-se
no sentido negativo, uma vez que , tal entendimento não se consegue extrair do
artigo em análise, e estando em causa razões de economia processual, não faria
sentido que o tribunal ficasse inibido
dessa possibilidade.
Como refere Isabel Celeste da Fonseca:
“tal mecanismo
encerra riscos e pode atentar contra as exigências do processo equitativo
consagrado no artº. 20n4, ínsito no direito de acesso aos tribunais, máxime,
tendo em conta as garantias de plena defesa, e por isso mesmo , o TCA Norte
demonstra o carater excecional do artº. 121º do CPTA.”
Possibilidade
de impugnar a decisão de convolação:
O nº2 do art. 121º possibilita impugnar a decisão de convolação com
base no não preenchimento dos requisitos de que depende.
Neste caso o tribunal superior poderá revogar a
decisão e ordenar que o tribunal recorrido não antecipe o julgamento do mérito
da causa e aprecie a providência cautelar requerida, ficando sem efeito o
julgamento sobre o fundo da causa.Mário Aroso de Almeida sustenta:
"A parte que discorde da antecipação ,pode assim, recorrer da decisão ,de acordo com as regras dos artigos 140.º e ss. no propósito de repristinar o processo cautelar.(...) Por conseguinte, essa decisão não pode deixar de ser qualificada como uma decisão respeitante à adoção de providencias cautelares, para efeito do disposto no art.º 143.º nº 2 CPTA, pelo que se deve entender que o eventual recurso não tenha efeito suspensivo porque o efeito temporal é decisivo neste tipo de decisões que são tomadas em função do momento a que se destinam."
Em suma, o legislador fez uma boa opção em consagrar este regime no CPTA , contudo, exige-se cuidado e prudência às partes, uma vez que, deve ser feita uma legítima previsão de riscos na utilização desse mecanismo, pois a antecipação da decisão também pode originar um resultado desfavorável à parte interessada.
Como refere VIEIRA DE ANDRADE :” A rigidez dos requisitos apresentados devem ser acompanhados de uma grande prudência dos tribunais de modo a não cair numa situação emergente das "boas intenções do legislador."
Bibliografia:
Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo;
Isabel Celeste da Fonseca, texto dos cadernos de justiça administrativa;
Mário Aroso de Almeida " O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos"
SILVA, Vasco Pereira da, "O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise"
Ac. TCA do Norte, de 26/7/2007, processo nº3160/06.EPRT
Aluna: Cinthia Camargos
nº21423 4ºano
sub-turma 1
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