sexta-feira, 29 de novembro de 2013


Análise ao artigo 121º do CPTA



“ Decisão da causa principal “

1 - Quando a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, permita concluir que a situação não se compadece com a adoção de uma simples providência cautelar e tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal.

 2 - A decisão de antecipar o juízo sobre a causa principal é passível de impugnação nos termos gerais. 

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                 Este artigo foi inspirado no regime italiano, e corresponde a uma das inovações trazidas pela última Reforma do Contencioso Administrativo.
      Com o incremento desta norma,  passou a ser possível emitir um juízo sobre a causa principal na pendência de um processo cautela (neste sentido, estarão em causa providências cautelares dos artigos 112º, 130 nº 4 e 137º do CPTA)
      A convolação do processo cautelar em processo principal  pode ser promovido por iniciativa oficiosa do tribunal ou suscitado pelas partes .
       A razão de ser da norma prende-se com fatores de economia processual e garantia da tutela jurisdicional efetiva.
     Para que o instituto previsto no art.º 121ºdo CPTA possa operar, é necessária a verificação cumulativa de dois pressupostos, destacados pelo TCA Norte 26.07.2007 (Tribunal Central  Administrativo) e pelo Professor AROSO DE ALMEIDA :


1.       “… a manifesta urgência na resolução definitiva do caso”


2.       “… tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito”

Análise de cada requisito:

                                  Quanto ao 1º :

 “O juízo substantivo sobre a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, impõe interpretação e aplicação exigentes, e impõe também, especial cuidado e grande prudência por parte do julgador

Quanto aos critérios para se apurar a “urgência”, deve-se atender à natureza das questões e à gravidade dos interesses em causa.


                                    O 2º requisito :

Tal obrigação remete para o facto de o tribunal não dever antecipar a decisão sobre o mérito da causa , mas sim , optar pela providência cautelar se seguramente ainda for possível trazer ao processo elementos que relevam para a decisão de fundo.

Quando falte a “segurança”, a melhor solução parece ser a defendida por AROSO DE ALMEIDA que afirma que o caminho será o de atribuir a providência sem mais indagações nos termos do art. 120º/1/a) CPTA.

      ainda autores (MARLENE SENNEWALD) que remetem para um terceiro requisito :

“Ouvir as partes interessadas”

 É uma manifestação do principio do contraditório, já que o juiz ouve as eventuais objeções que as partes formulem acerca da verificação dos requisitos supra referidos , uma vez que, a audição das partes corresponde a um dever inerente ao juiz .


Aresto do TCA Norte de 26.07.2007, processo nº 3160/06.3BEPRT


         Um aresto que versa sobre o tema em causa, teve lugar após uma sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal  do Porto  de 23.02.2007, em que  foi intentado um pedido de suspensão da eficácia de um ato de punição disciplinar(dois anos de inatividade ) a um bombeiro do Município do Porto, como preliminar de uma Ação Administrativa Especial . O requerente invocou a ilegalidade da decisão , sugerindo ainda a convolação da pretensão em anulação daquele despacho, pois no  seu entender estariam preenchidos todos os pressupostos do art.º 121º do CPTA. Após a oposição do Município do Porto, o requerente veio ainda cumular uma providência de admissão provisória em concurso aberto para curso de promoção para Bombeiros Sapador.

         O TAF do Porto veio considerar verificados os pressupostos do 121º do CPTA, tendo julgado improcedente a pretensão de impugnação do ato e prejudicada as restantes questões.

        Após tal situação , o Bombeiro muito surpreendido, veio então, recorrer da decisão para o TCA Norte , pois acreditava firmemente na violação do art. 121º do CPTA, uma vez que , a antecipação da decisão de fundo e a convolação do processo cautelar e principal, só deveria ser possível se o resultado fosse favorável ao recorrente.

       Neste aresto , o TCA do Norte explicita quais são os pressupostos de aplicabilidade do mecanismo (supra citados) e enumera  os riscos a que ficam sujeito as partes ao recorrer ao art. 121º.

        O TCA considerou que os interesses relevantes envolvidos, para efeitos de aferição de manifesta urgência ,não tem de ser relativos a direitos, liberdades e garantias, já  que para o efeito já estava previsto o mecanismo do art º 109º do CPTA. Antes pelo contrário, a urgência pode ser indiciada pelo facto de o litigio versar sobre outros direitos, como por exemplo , alguns dos valores do artº.9nº2 do CPTA, não excluindo que outros bens também relevantes, pudessem justificar a utilização de decisão urgente (como seria o caso em questão).

O TCA Norte portanto entendeu:


As ilegalidades imputadas à  decisão administrativa pelo requerente cautelar, a fim de justificar o fumus boni iuris necessário para a concessão  das providências  pretendidas, seriam exatamente as mesmas que serviam de causa de pedir na ação principal, sendo que não havia na verdade , um único facto de prova relevante para a decisão  da causa que tivesse de ser sujeito ao fogo da prova.”

     Ainda sobre a questão de ser necessário  um juízo positivo da utilização do art. 121º, o TCA Norte  pronunciou-se no sentido negativo, uma vez que , tal entendimento não se consegue extrair do artigo em análise, e estando em causa razões de economia processual, não faria sentido que  o tribunal ficasse inibido dessa possibilidade.

Como refere  Isabel Celeste da Fonseca:

“tal mecanismo encerra riscos e pode atentar contra as exigências do processo equitativo consagrado no artº. 20n4, ínsito no direito de acesso aos tribunais, máxime, tendo em conta as garantias de plena defesa, e por isso mesmo , o TCA Norte demonstra o carater excecional do artº. 121º do CPTA.”


Possibilidade de impugnar a decisão de convolação:

O  nº2 do art. 121º possibilita impugnar a decisão de convolação com base no não preenchimento dos requisitos de que depende.
       Neste  caso o tribunal superior poderá revogar a decisão e ordenar que o tribunal recorrido não antecipe o julgamento do mérito da causa e aprecie a providência cautelar requerida, ficando sem efeito o julgamento sobre o fundo da causa.
Mário Aroso de Almeida sustenta:

"A parte que discorde da antecipação ,pode assim, recorrer da decisão ,de acordo com as regras dos artigos 140.º e ss. no propósito de repristinar o processo cautelar.(...) Por conseguinte, essa decisão não pode deixar de ser qualificada como uma decisão respeitante à adoção de providencias cautelares, para efeito do disposto no art.º 143.º nº 2 CPTA, pelo que se deve entender que o eventual recurso não tenha efeito suspensivo porque o efeito temporal é decisivo neste tipo de decisões  que são tomadas em função do momento a que se destinam."


      
     Em suma, o legislador fez uma boa opção em consagrar este regime no CPTA , contudo, exige-se cuidado e prudência  às partes, uma vez que, deve ser feita uma legítima  previsão de riscos na utilização desse mecanismo, pois a antecipação da decisão também pode originar um resultado desfavorável à parte interessada.

      Como refere VIEIRA DE ANDRADE :” A rigidez dos requisitos apresentados devem ser acompanhados de uma grande prudência dos tribunais de modo a não  cair numa situação emergente das "boas intenções do legislador."




Bibliografia:







Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo;


 Isabel Celeste da Fonseca, texto dos cadernos de justiça administrativa;


 Mário Aroso de Almeida  " O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos"
 
Mário Aroso de Almeida e Diogo Freitas do Amaral , "Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo"

 
 ANDRADE, José Carlos Vieira de, "A Justiça Administrativa"

 
SILVA, Vasco Pereira da, "O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise"

 Ac. TCA do Norte, de 26/7/2007, processo nº3160/06.EPRT



Aluna: Cinthia Camargos

 nº21423 4ºano sub-turma 1

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